Odiar-se

    Quando nos odiamos parece que tudo fica mais difícil. Até tomar um banho parece a coisa mais complicada a se fazer. 

    Gostaria tanto de fazer e ser tantas coisas, ser sexy, ser inteligente, ser culta, ser extraordinária. 

     Assisti um dorama há alguns anos, “Extraordinary You”, tinha esse título porque o Haru, mocinho da história, via em Dan-Oh, a protagonista, coisas que ela não via em si mesma, mas que corria atrás de alcançar. 

    Sei que nunca serei a Dan-Oh, pois ao contrário dela, estou estagnada na minha própria tristeza e procrastinação. Há momentos de alegria com certeza, no entanto, uma efemeridade os rodeia e os destrói em questões de minutos. 

      O que é ser algo? Alguém? Arte? Poesia? Beleza? Eu não sei. Queria ser sinônimo de tudo isso. Há tantas mulheres incríveis as quais eu venderia minha alma para ser igual: Audrey, Anna Karina, Julie Delpy, e até as mais novas como Sabrina Carpenter ou Olivia Rodrigo, ou mesmo alguma garota que estude comigo. Ser brilhante, bela, admirável... Deve ser um sonho. 

     Desde a coisa mais básica que gostaria de fazer e não consigo, como usar roupas que me valorizassem mais, infelizmente não sou magra para isso e gosto de coisas como “X-Men” e “Star Wars” rs, quem esperaria beleza e sensualidade de uma menina que aprecia isso. 

     Ou mesmo criar algo... tenho tantas ideias, revistas, documentários, livros e peças que quero escrever e desenvolver, todavia travo nesse abismo dde insegurança. Talvez minha vida seja feita de fatalidades, tragédias confirmadas causadas pelo meu cérebro. 

     Sou dominada pela dúvida do “e se”; e se eu tentasse, e se eu criasse isso, e se eu comprasse essa roupa, e se eu usasse essa maquiagem; achariam meu trabalho fantástico? Me achariam bonita? Contudo, a resposta é sempre a mesma: o não. 

      Não é nem não. É medo, é receio, é vergonha, é preguiça e cansaço. Cansaço quiçá de ser eu mesma, como se nada bonito pudesse fluir de minha aparência, como se eu não pudesse criar nada realmente surreal ou bom o suficiente, nada que agradasse. 

       Provavelmente eu seja patética por desejar tanto agradar os outros, surpreender, receber admiração, mas não consigo evitar. Sou egocêntrica, vivo disso, preciso disso. Também sou imediatista, ou me tornei pelo menos, necessito que as coisas sejam rápidas, fico ansiosa, fico ansiosa só de sair com uma blusa que mostre meus braços, preciso que tudo acabe logo antes que eu enlouqueça e não quero ver dar errado. 

       Viver assim tem sido cansativo para mim... Imagino que para todo mundo. 

      Quando viramos tão dependentes da aprovação alheia? Podemos jogar a culpa na mídia, mas não é verdade, é somente uma desculpa para não assumirmos que somos um fracasso encarnado que desde os tempos remotos espera aplausos. 

       Nunca seremos bom o suficiente. Eu pelo menos não serei, não para mim. O problema é que sou acima de tudo uma covarde (uma covarde que julga covardes, olha que irônia), não tenho coragem de levantar da cama; fico deitada o dia todo mexendo no celular ou fazendo trabalhos da faculdade dando a desculpa que estou cansada enquanto me lamurio que não estou criando nada, que não estou escrevendo, ou pintando ou dançando tanto quanto gostaria. Essa é a artista que almejo ser? 

        Penso que se eu fosse mais bonita as coisas seriam mais fáceis. As coisas semore parecem fáceis para as magrelas pelo menos, tenha uma barriga chapada, cintura, coxas e braços finos, além de uma bela face, e você terá o mundo aos seus pés. Bom, creio que eu pelo menos não teria tanto o que me comparar, porém, agora, há tantas garotas que já são tão bonitas e magrinhas e como se Deus não pudesse ser ainda mais injusto, Ele dá talento à elas?! Capacidade, força e coragem para criar! 

       Ah, eu me sinto tão revoltada, tão invejosa, e mais ainda que desejo me afundar na cama, me encolher e encolher e encolher em meu casulo até virar o vulto de uma bolinha e sumir para sempre. Sem mais julgamentos, sem mais julgamentos de mim mesma. 

      O pior é que anseio fazer e criar tantas coisas, quero ir para a Europa, ser poetisa, escritora, ler tudo da França e do leste europeu, fotografar, dançar, dirigir filmes e documentários, ouvir música erudita, ser jornalista e artista, que nem sei por onde começar ou o que quero fazer de fato. 

      Acima de tudo, quero ser bonita, mas é como Olivia Rodrigo escreveu, “bonita não é bonita o suficiente”. Eu posso pular meu almoço ou deixar de comer bolos em aniversários, e nada será suficiente, porque no momento que eu não aguentar e tomar um cappuccino com um doce, eu terei estragado tudo, terei perdido tudo. 

      Minha roupa parecerá justa e meus pulsos maiores, e eu saberei que nunca poderei ser artista, porque só as belas são brilhantes, ou ao menos podem fingir ser, e eu não sou nem bela nem brilhante e não consigo fingir, oras, não consigo nem usar um cropped sem querer cortas os pulsos ou rasgar minha barriga com uma faca de cortar carne.

      Em meus delírios anoréxicos eu sou a pior das assassinas, meus gores superam qualquer filme de horror e eu seria capaz de traumatizar uma legião. Acho que isso diz mais sobre o quanto eu me odeio do que qualquer coisa, nem mesmo quem fazia bullyng comigo me odiou e desprezou tanto quanto eu mesma me repúdio. 

     Se eu fosse mais forte e tivesse mais coragem dentro do meu peito, quem sabe poderia lidar melhor com isso, poderia enfrentar minhas inseguranças e criar algo de verdade, podia até mesmo usar uma minissaia como gostaria. Mas por enquanto continuo aqui, escrevendo este desabafo, querendo arrancar minha pele fora e cortar todo o meu corpo, sonhando com a artista e bela dama que poderia ser, e que permanece encurralada pelos próprios julgamentos e nojos. 

     Me pergunto quem eu seria se não prezasse tanto pela magreza doentia, se não me sentisse tão fraca e para baixa. O quanto vale um antidepressivos nas nossas vida? O quanto vale existir apenas sendo controlada por uma pílula? Isso é mesmo uma vida? Bom, pelo menos talvez eu levante da cama e crie algo, entretanto, até quando? Até eu surtar pela minha aparência novamente e jogar tudo no lixo porque nada se consegue sem uma estética e roupas bonitas? Ah, como sou doente, vivendo em meio à ilusões autodepreciativas, fugindo delas por meio de remédios viciantes... 

       Que vida! Que canseira! Pelo menos algo a anorexia e a procrastinação não tiraram de mim: os pensamentos, penso muito, penso até me desnortear em meio à tantas palvras e imagens em minha mente. O duro é que com eles, vêm as angústias. A vida se tornou mesmo problemática. Poderíamos voltar para os cinco anos, quando todos éramos belos e artistas. Bem que o ódio, sendo tão presente, poderia ser uma fonte de gás na gente e nos motivar. 

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